“Fui negativado durante a pandemia. O que fazer?”

A inadimplência no Brasil vem batendo recordes. Principalmente devido ao grande número de desempregados – pessoas que perderam seu poder de compra e contraíram dívidas tendo os seus nomes inscritos em órgãos de proteção de crédito, como Serasa e SPC (Serviço de Proteção ao Crédito). Isso prejudica, por exemplo, a concessão de créditos e aluguéis e dificulta financiamentos e empréstimos.

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)[1] são 12,9 milhões de desempregados no Brasil. Essa taxa aumentou 12,2% somente no primeiro trimestre de 2020. De acordo com dados da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), realizada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), e cujos dados foram publicados pela revista Exame[2], 66,6% das famílias brasileiras entrevistadas tinham, em abril de 2020, dívidas relacionadas com cheque especial, cartão de crédito, empréstimo pessoal, prestação de automóvel, prestação de seguros, carnês de loja e cheque pré-datado. Um aumento de 0,4% com relação ao mês de março de 2020 e uma alta de 3,9% quando comparado aos dados de abril de 2019.

A Peic também mostrou que a inadimplência entre março e abril de 2020 permaneceu igual: 25,3% dos entrevistados possuíam contas em atraso. Esse número é 1,4% maior que o mesmo período de 2019, quando foram registrados 23,9%. A tendência, devido ao cenário econômico do Brasil durante a pandemia do COVID-19, é esses números aumentarem.

Trabalho informal e perda da renda mensal

Muitos brasileiros se tornaram autônomos ou freelancers. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), publicada pela Agência Brasil[3], em março de 2020, a taxa de trabalhadores informais é de 11,6 milhões.

De acordo com informações do Portal do Empreendedor, publicados pelo site Poder 360[4], existem mais de 10 milhões de MEIs (microempreendedores individuais) cadastrados no país. Só nos primeiros quatro meses de 2020 foram 586 mil novos formalizados no site.

Esses trabalhadores informais conseguiam receber uma renda variável e incerta antes da pandemia de Coronavírus chegar ao Brasil. Porém, por conta das medidas necessárias de isolamento social para evitar a propagação do vírus, o rendimento dessas pessoas caiu drasticamente chegando até a ser totalmente nulo para algumas famílias. Com o comércio, as escolas e grande parte dos serviços fechados ou paralisados essas pessoas não têm como manter o seu padrão financeiro.

“Posso ter o meu nome sujo durante a pandemia?”

Mas, as contas não param. Todo mês os boletos chegam: condomínio, aluguel, água, energia elétrica, internet, gás etc. Devido a total falta de dinheiro, muitas pessoas estão passando necessidade e não têm condições de arcar com as suas contas. A lei fluminense 8.769/2020[5] já proíbe o corte de serviços considerados essenciais durante a emergência causada pelo coronavírus:

Art. 1º Fica vedada a majoração, sem justa causa, do preço de produtos ou serviços, durante o período em que estiver em vigor o Plano de Contingência do Novo Coronavírus da Secretaria de Estado de Saúde. Ver tópico (3 documentos)

§ 1º Para os fins da definição de majoração de preços de que trata o caput deste artigo deverão ser considerados os preços praticados em 01 de março de 2020. Ver tópico

§ 2º A proibição de que trata o caput deste artigo se aplica aos fornecedores de bens e serviços nos termos do artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor. Ver tópico

Art. 2º Fica vedada a interrupção de serviços essenciais por falta de pagamento, pelas concessionárias de serviços públicos. Ver tópico (6 documentos)

§ 1º Entende-se como serviços essenciais para efeito do disposto no caput deste artigo, o fornecimento de água e tratamento de esgoto, gás e energia elétrica. Ver tópico (4 documentos)

§ 2º Após o fim das restrições decorrentes do Plano de Contingência, as concessionárias de serviço público, antes de proceder a interrupção do serviço em razão da inadimplência anterior a março de 2020, deverão possibilitar o parcelamento do débito pelo consumidor. Ver tópico

§ 3º O débito consolidado durante as medidas restritivas não poderão ensejar a interrupção do serviço, devendo ser cobrado pelas vias próprias, sendo vedadas a cobrança de juros e multa. Ver tópico

§ 4º O disposto neste artigo é extensivo aos MEIs (Micro Empreendedores Individuais), às Micro e Pequenas Empresas, a aos optantes pelo regime de arrecadação de tributos denominado Simples Nacional (Lei Complementar Federal 123, de 14 de dezembro de 2006). Ver tópico

OBS: Você pode acessar a íntegra lei clicando no link disponível nas REFERÊNCIAS e nas notas de rodapé.

Mas, isso ainda não é suficiente. Por isso está em aprovação um projeto de lei para evitar que as pessoas tenham o nome sujo por dívidas durante a pandemia de COVID-19. Já foi aprovado no Senado Federal[6] o Projeto de Lei (PL) 675/2020, que proíbe a inclusão do inadimplentes em cadastros negativos enquanto vigorar o estado de calamidade pública no país – a princípio esse prazo termina em 31 de dezembro de 2020. Como ele sofreu modificações, vai voltar para a Câmara dos Deputados nos próximos dias. Para se tornar lei, ele ainda precisará da sanção do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

ANBC garante renegociação antes do nome sujo.

A Associação Nacional dos Bureaus de Crédito (ANBC), que representa empresas como SERASA e SPC, ampliou para 45 dias o prazo para o devedor ter seu nome inscrito nos órgãos de proteção ao crédito[7]. A contar do comunicado recebido, o inadimplente terá esse prazo para renegociar com o credor e evitar sofrer as sanções de ficar com o nome sujo. O prazo normal é de dez dias, porém, em decorrência da situação de pandemia a associação resolveu adotar a medida para ajudar os consumidores. A medida passou a valer no dia 17 de abril de 2020 por 90 dias. Se for necessário, pode ser prorrogada.

O que dizem os advogados

Enquanto a lei não entra em vigor, o inadimplente pode tomar algumas medidas a fim de evitar que o seu nome seja incluído nesses cadastros. O advogado Ricardo Menezes, da Costa&Menezes Advogados explica que demonstrar boa-fé e empenho para solucionar o problema é o caminho ideal: “deve-se notificar o credor, sempre fazendo prova dessa tentativa de impedir a negativação. É importante negociar, sempre demonstrando que foi afetado pela crise gerada pela pandemia. Sugere-se cancelar o que não for necessário, e pedir a postergação do pagamento do que for essencial, sempre priorizando o pagamento cuja inadimplência gere mais multas e encargos”, enumera o advogado.

Mas, se mesmo assim, o credor sujar o nome do inadimplente, é possível processá-lo. Porém, sob determinadas condições: “Caso a negativação tenha ocorrido sob a vigência da mencionada lei, sim. Antes da vigência da Lei, somente no caso de o credor efetivar a negativação mesmo tendo negociado a postergação do vencimento com o devedor”, explica o advogado Ricardo Menezes.

Para proteger o consumidor existem diversas Leis, como por exemplo, o CDC, a Lei 8.078/199 e as demais leis que regem as relações civis, como o Código Civil. Com base na Teoria do Diálogo das Fontes, caso uma lei proteja mais o consumidor do que o CDC, será ela aplicada ao caso, uma vez que a razão de existir das leis de proteção ao consumidor é a proteção deste. O inadimplente só será protegido por essas leis, se for consumidor.

Caso esse inadimplente não seja consumidor, como ocorre nas relações locatícias entre particulares, não será aplicado o CDC. No entanto, na Lei do Inquilinato (Lei 8.245/1991) ou no Código Civil (Lei 10.406/2002), há normas que protegem esse inadimplente contra abusos, bem como os propicia o direito a renegociação. O mesmo ocorre em outros casos regidos por outras normas do ordenamento jurídico brasileiro, como ocorre na alienação fiduciária de bens imóveis regida pela Lei 9.514/1997.

O advogado Ricardo Menezes explica ainda que dependendo do caso podem ser identificados excessos por parte do credor: “se negar a renegociar, uma vez comprovado o prejuízo do devedor, é considerado abuso do direito por parte do credor, tal entendimento está sendo amplamente discutido pela doutrina, e até mesmo sendo aplicado pelo Judiciário. Outro excesso é a imposição de multas e juros desproporcionais e desarrazoadas, bem como o corte de serviços considerados essenciais sem possibilitar ao devedor a quitação em tempo hábil”, enumera o advogado.

O escritório Costa & Menezes Advogados Associados se encontra apto a te orientar e buscar a melhor solução para o seu caso.

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REFERÊNCIAS:

[1] Agência IBGE de Notícias. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/27535-desemprego-sobe-para-12-2-e-atinge-12-9-milhoes-de-pessoas-no-1-trimestre. Acesso em: 19/05/2020.

[2] EXAME. Disponível em: https://exame.com/economia/em-meio-a-pandemia-familias-com-dividas-em-abril-chega-a-666/. Acesso em: 19/05/2020.

[3] Agência Brasil. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2020-03/informalidade-cai-mas-atinge-38-milhoes-de-trabalhadores. Acesso em: 19/05/2020.

[4] Poder 360. Disponível em: https://www.poder360.com.br/economia/numero-de-meis-no-brasil-chega-a-10-milhoes/ Acesso: 19/05/2020.

[5] JUSBRSASIL. Disponível em: https://gov-rj.jusbrasil.com.br/legislacao/826076420/lei-8769-23-marco-2020-rio-de-janeiro-rj. Acesso em: 19/05/2020.

[6] Jornal Contábil. Disponível em: https://www.jornalcontabil.com.br/senado-aprova-projeto-que-proibe-inclusao-no-spc-e-serasa-ate-o-final-de-2020/. Acesso em: 19/05/2020.

[7] Valor Investe. Disponível em: https://valorinveste.globo.com/produtos/servicos-financeiros/noticia/2020/04/09/devedor-tera-mais-prazo-para-renegociar-antes-de-ter-o-nome-sujo-dizem-biros.ghtml. Acesso em: 19/05/2020.

Crédito da imagem utilizada: Freepik

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