Desconsideração da Personalidade Jurídica: primeiros aspectos

Quando se constitui uma sociedade civil ou empresária – desde que observados os requisitos legais – lhe é atribuída a chamada personalidade, que, em síntese, é colocar essa sociedade como o centro de direitos e deveres. Personalizar um determinado ente é dar as consequências da titularidade negocial, titularidade processual e, sobretudo, a responsabilidade patrimonial. (assim, a sociedade passa a poder realizar negócios jurídicos com outras pessoas; passa a ter capacidade para estar em juízo; e passa a ter patrimônio próprio – distinto do patrimônio de seus sócios).[1] [2]

Pois bem, no âmbito das sociedades de responsabilidade limitada e nas hipóteses em que não se pode responsabilizar o sócio[3], existe uma teoria conhecida como teoria da desconsideração. O principal mérito dessa teoria é desconsiderar a separação de patrimônio dos sócios por obrigações realizadas pela sociedade.

Obviamente, para ocorrer essa desconsideração da separação dos patrimônios, se faz necessária a presença de alguns pressupostos, entre eles, o importantíssimo uso abusivo da sociedade com o intuito – evidente – de fraudar à lei ou obrigações assumidas.

Dessa forma, a teoria da despersonalização entrega a possibilidade de prescindir da forma de sociedade criada, negando a existência autônoma como sujeito de direito diante de uma determinada situação. Em síntese, e em última análise, a despersonalização visa responsabilizar e atingir o patrimônio particular e pessoal do(s) sócio(s) por obrigações contraídas pela sociedade (ou em nome da sociedade).[4]

Independentemente da vertente doutrinária[5] adota pelo operador do direito que esse texto lê, a desconsideração da personalidade jurídica deve ser entendida como ferramenta para superar a personalidade jurídica da sociedade e atingir a do sócio,[6] quando presentes o cometimento de fraude ou o abuso do direito pela personalidade jurídica conferida pelo ordenamento.

Alcança-se a possibilidade dessa teoria com regramentos específicos a depender na natureza da relação jurídica entre sociedade e o credor, com tratamento na CLT[7] (se a relação for trabalhista), no CTN[8] (se a relação for com o fisco), ou no CC (quando a relação for a residual as outras citadas). Na trabalhista se busca o estabelecimento de responsabilidade solidária por débitos trabalhistas entre empresas do mesmo grupo e, nas outras, se pretende a responsabilização pessoal dos sócios.

É bom que se frise que a desconsideração tem pertinência quando, na casuística, não se pode imputar responsabilidade do ato ao sócio controlador ou ao representante legal da pessoa jurídica. Se assim for, a imputação é direta e não há que se falar em desconsideração da personalidade jurídica.

O Artigo 50 do Código Civil (CC)[9] – com texto incluído pela chamada Lei da liberdade econômica (lei 13.874/2019) – pretende deixar claro a diferença entre desvio de finalidade e confusão patrimonial – requisitos autorizadores da desconsideração. Portanto, o empresário (em sentido amplo) que usar de forma errada a finalidade social (da sociedade) querendo prejudicar outrem, ou que misturar o patrimônio social com o seu particular, causando danos a terceiros, praticará atos de desvio de finalidade e confusão patrimonial, respectivamente.

Aos empresários deve-se evitar tais práticas no decorrer do exercício da atividade empresarial, aos credores que observarem tal prática, devem buscar, através do advogado, provar a insuficiência patrimonial (pressuposto lógico) e o ato de abuso (seja pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial).[10]

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Texto de Luiz Costa

Mestrando em Ciências Jurídicas pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa – FDUL. Pós graduando em Direito Empresarial pela FGV. Pós Graduando em Advocacia Societária pela Escola Brasileira de Direito – EBRADI. Sócio Fundador do escritório Costa & Menezes Advogados Associados e do Grupo LR – Assessoria Jurídica | Contabilidade | Gestão de Imóveis | e Marketing & Comunicação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COELHO, Fabio Ulhoa. Desconsideração da personalidade jurídica. São Paulo: RT, 1989.

DANELUZZI, Maria Helena Marques Braceiro. ROCHA, Silvio Luis Ferreira da. Aspectos da desconsideração da personalidade jurídica no ordenamento jurídico brasileiro. In Revista Brasileira de Direito Comercial, nº. 32 – dez/jan de 2020.

RAMOS, Ernesto Lopes. Desconsideração da personalidade. Dissertação de Mestrado REQUI


[1] Artigo 20 do CC: “As pessoas jurídicas têm existência distinta da dos seus membros”.

[2] Deve-se ressaltar que a correspondência entre personificação e responsabilidade patrimonial não é exata, pois o ordenamento brasileiro permite que determinadas sociedades possuam sócios que respondam pessoalmente com os seus respectivos patrimônios. (Sociedade em nome coletivo; Sociedade em comandita simples e a comandita por ações). Contudo, essas estão longe de serem usuais na praxe societária. As Sociedades por cotas de responsabilidade limitada (LTDA) são – disparadas – a principal opção dos empresários na abertura da suas atividade empresarial.

[3] Algo que ocorre quando há deliberação do sócio contrária à lei ou ao contrato social, com o consectário de ocorrer a responsabilização subsidiária, porém ilimitada os sócio pela obrigação.

[4] Parece mais fácil entender através da aplicação dada, por exemplo, no Direito norte americano, onde busca-se dar uma solução conforme a justiça (a equity). Afasta-se a personalidade jurídica sempre que uma corporação (corporations) seja utilizada para cometer uma fraude ou justificar um ato contrário à visada equidade – que deve se prestar nas relações obrigacionais com terceiros – ou, ainda, um ato contrário à aplicação da lei. Para mais sobre o direito norte americano e alemão v. RAMOS, Ernesto Lopes. Desconsideração da personalidade. Dissertação de Mestrado, pp. 318 e sgs.

[5] Vertente da teoria subjetiva; ou a vertente que considera necessário distinguir entre pessoa natural ou pessoa jurídica e entre diversas figuras de pessoa jurídicas (resolvidas ao final com a ponderação de normas); ou, ainda, a teoria determinada através de critérios objetivos. Para aprofundar o tema das vertentes doutrinárias v. DANELUZZI, Maria Helena Marques Braceiro. ROCHA, Silvio Luis Ferreira da. Aspectos da desconsideração da personalidade jurídica no ordenamento jurídico brasileiro. In Revista Brasileira de Direito Comercial, nº. 32 – dez/jan de 2020, pp. 75-77. 

[6] Nesse sentido, REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial, vol. 1. 34ª. ed. São Paulo: Saraiva, p. 271.

[7] Art. 2º § 2º.

[8] Art. 135.

[9] Aos atentos ao espaço didático, artigo que adotou a teoria maior da desconsideração, pois exige além da insuficiência patrimonial, a demonstração do abuso.

[10] Novamente, aos atentos ao espaço didático, isso nas relações civis e empresariais, pois na relações trabalhistas e consumeristas adota-se a teoria menor, bastando comprovação da insuficiência patrimonial.

Foto: Freepik

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